Compreender a ideia de contexto é um excelente passo para se começar a entender a Psicologia. Nós, psicólogos (sejamos analistas do comportamento ou não) adoramos este conceito. Para ser honesto, a noção de contexto não é querida apenas por psicólogos, mas por todos os cientistas que lidam com aspectos da conduta humana. A paixão pelo termo deriva de um fato muito simples: ele ajuda a tornar clara a complexidade humana.
Dada a amplitude da noção de contexto e sua apropriação por diversas áreas, não cabe neste texto explicar cada um dos seus usos. Ao invés disso, discutirei como contexto é definido e utilizado na análise do comportamento (no entanto, não vou falar sobre cultura).
Vamos começar, então. O primeiro passo é esquecer o nome “contexto” e entender o que é “controle de estÃmulos”.
Controle de EstÃmulos
A história começa com pombos e ratos. Acalmem-se, chegaremos até o conceito de atenção. Por enquanto, vamos entender como animais ‘inferiores’ podem nos ajudar a compreender comportamentos humanos complexos.
No inÃcio dos seus estudos, Skinner colocava ratos e pompos em caixas de condicionamento (popularmente conhecidas como caixas de Skinner). Os animais podiam ganhar alimento ou água caso fizessem alguma coisa que o investigador julgasse bacana. Geralmente, os experimentadores achavam supimpa que os pombos bicassem um disco e os ratos pressionassem uma barra. E assim era. Quando eles emitiam esses comportamentos podiam se regozijar em um delicioso banquete de água e ração. Skinner percebeu que todo comportamento que precedia o banquete ocorria com mais frequência. A relação era relativamente simples: uma resposta (pressionar a barra) produzia um estÃmulo (o banquete). A comida produzida fortalecia a resposta que a precedia. Esse fenômeno é chamado de reforçamento. Você pode ler sobre ele aqui. Divirta-se.
O conceito de reforçamento abalou a Psicologia. Mas Skinner, que nunca foi um cara distraÃdo, percebeu que havia mais na relação comportamental do que simplesmente o reforço. Ele notou que o contexto (olha ele aÃ) controlava o comportamento e fez experimentos que demonstraram que isso de fato ocorria. Os experimentos eram muito simples, mas mudaram o mundo dos pombos e ratos. Agora, os animais só podiam desfrutar de seu banquete caso uma luz colorida estivesse acesa. Quando ela estava apagada, os animais não recebiam suas delÃcias; não importava se dançassem, cantassem ou recitassem Shakespeare, não havia comida com a luz apagada.
Resumindo: com a luz acesa, pressionar a barra produzia água. Com a luz apagada, nada feito. Inicialmente, os animais agiam da mesma forma quer a luz estivesse ligada ou não. No entanto, não demorava muito para que eles passassem a pressionar a barra apenas com a luz acesa. Parecia que os ratos “sabiam” que só poderiam mergulhar em ração quando a luz banhasse sua calorosa morada. Skinner assim definiu o ocorrido: “a luz sinaliza a disponibilidade do reforçador contingente à resposta”. Traduzindo em palavras mais normais, os estÃmulos controlam o comportamento por estarem relacionados a eventos reforçadores. Eis uma notação do ocorrido:
contexto –> resposta –> resultado
luz acesa –> pressionar a barra –> luxuoso banquete
luz apagada –> pressionar a barra –> nada não
Diz-se que a resposta de pressionar a barra está sob controle da luz: daà o termo “controle de estÃmulosâ€.
Olhando a notação acima, é comum pensar “até eu que sou mais bobo deixaria de pressionar a barra com a luz apagada”. Eu não poderia concordar mais. Acontece que essa descoberta simples ajudou a entender o que é a percepção. Vamos a ela?
Percepção
Lá está você, mais jovem, aprendendo o que são garotos(as). Inicialmente, você se comporta “como uma metralhadora” e atira seus papos e esforços para todos os lados. Depois de muitas falhas e algumas conquistas, você quase que automaticamente passa a notar um padrão bem claro. As pessoas que te olham e sorriem são aquelas com quem a conversa flui melhor. Com o tempo, sua percepção é aguçada e seus esforços não são mais desperdiçados; seu alvo é claro: a pessoa com sorriso aberto e olhar insinuante. É isso: você percebe os sinais. Já que o rato ganhou uma, eis também para você uma notação do ocorrido:
pessoa bacana sorrindo –> puxar conversa –> papo agradável (beijos, até)
pessoa bacana séria –> puxar conversa –> tente outra vez
Nesse momento, algo deve ficar clarÃssimo: aprendemos a perceber somente os objetos e eventos relacionados ao que nos é importante de alguma forma. É o que ocorre após a resposta (seu resultado) que produz a percepção. Você não teria aprendido a diferenciar qual o melhor tipo de pessoa para paquerar se não tivesse resultados diferentes em situações diferentes. Foi o papo agradável, no seu caso, e a água, no caso do rato, que tornaram a luz acesa e os sorrisos eventos a serem notados. Se você obtivesse a mesma consequência com pessoas sorridentes e sérias, o sorriso não seria algo notável.
Pense em profissionais de diferentes áreas. Um dermatologista é capaz de dizer muito mais sobre um pedaço da pele do que você. Um psicólogo experiente parece ter uma percepção quase sobrenatural sobre os padrões de comportamento de alguém. Um bom engenheiro pode dizer sobre os pontos fortes e fracos de uma casa apenas observando suas colunas. Os pintores olham para um quadro e são capazes de descrever a direção das pinceladas, a técnica utilizada e o estilo do autor. A percepção aguçada dos bons profissionais é resultado de treino especial para detectar detalhes que outras pessoas não notam; é isso o que os faz especialistas. Mas eu disse que o controle pelo contexto (o controle de estÃmulos) é estabelecido por sua relação com algo importante. O que os profissionais ganham sabendo se comportar de forma diferente diante de estÃmulos especÃficos? Ora, para começar, dinheiro. E, mais importante ainda, sucesso e reconhecimento por algo que fazem bem.
É comum a muitas correntes da Psicologia, e mesmo pessoas leigas, afirmarem que a Percepção é pessoal e moldada pela experiência de cada um. Isso não podia ser mais verdade. Uma árvore é percebida de forma diferente por pessoas distintas. Um lenhador, por exemplo, que aprendeu sobre diferentes tipos de madeira durante sua profissão, provavelmente percebe a árvore em termos financeiros. Um casal de namorados pode perceber a árvore como um espaço romântico para estender uma toalha e dizer palavras de amor. O lenhador e os namorados percebem a árvore de forma diferente, pois ela está relacionada com consequências e respostas distintas para eles.
O exemplo dado acima é satisfatório, mas o comportamento humano é muito mais complexo. O lenhador pode perceber a árvore de forma diferente em contextos diferentes. Quando ele põe sua roupa de trabalho e é pressionado pelo chefe, uma árvore é dinheiro. Por outro lado, se ele está passeando com sua namorada em um parque, uma árvore pode lhe parecer o local perfeito para o amor. Essas aparentes, e falsas, contradições ocorrem porque o comportamento é, geralmente, controlado por muitos estÃmulos simultaneamente. Eis uma notação do comportamento do lenhador nos dois exemplos dados:
no trabalho + árvore –> derrubar –> dinheiro
com a namorada + árvore –> conversar –> carinhos e palavras de amor
Há algo a ser dito. Vejam como cada contexto controla uma resposta diferente. Por que? Porque se o lenhador levar a namorada para conversar debaixo de uma árvore no meio do trabalho, vai ser mandado embora. Da mesma forma, se derrubar uma árvore no parque quando passeia com a namorada, provavelmente levará um fora. Os diferentes contextos controlam respostas diferentes porque cada contexto está relacionado a um reforçador especÃfico. No caso, ora dinheiro, ora carinho.
Chega de percepção. Como faço para manter a atenção de vocês? Vamos ver!
Atenção
Assim como a percepção, a atenção está relacionada a consequências importantes para o comportamento. Vamos ao exemplo que vocês adoram: a paquera. Quando você está em um bar à procura de alguém interessante, você deliberadamente olha para todos os lados procurando o sinal da fortuna: sorrisos. Em outras palavras, você está “atento”. Atentar, nesse sentido, nada mais é do que procurar por uma indicação de que algo interessante está disponÃvel. Achar esse sinal é importantÃssimo para as pessoas. Para os animais também! O pombo que ganha água quando bica o disco na presença da luz azul e nunca da vermelha, praticamente não se importa quando a luz vermelha aparece. Mas a luz azul é tão interessante para o bichinho que até parece amor. Agora, duvido alguém me contrariar e afirmar que não adora o sorriso de quem se está paquerando.
Outro modo de entender o que é a “atenção†é no caso em que olhamos fixamente para algo (ou nos concentramos em ouvir, saborear, etc). De forma semelhante ao que foi dito anteriormente, essa forma de atentar está sob controle de estÃmulos relacionados a eventos importantes para nós. Os exemplos são muitos. Alguém que ouve música fica atento a ela porque isso lhe dá prazer. Um segurança olha fixamente para a tela que mostra o exterior do edifÃcio porque caso algo lhe escape ele terá problemas. Prestamos atenção especialmente em alguns textos porque disso depende a nossa boa nota em uma disciplina ou simplesmente porque o texto é prazeroso.
Atenção também pode ser compreendida de outro modo, como uma reação natural a mudanças do ambiente. Parece que o nosso organismo foi filogeneticamente preparado para atentar a novos estÃmulos automaticamente. Isso, claro, é uma forma de defesa: evita que sejamos pegos de surpresa. Qualquer barulho ou movimento inesperado chama a nossa “atenção” rapidamente, permitindo que nos preparemos para o que pode acontecer.
Os conceito de atenção e percepção têm implicações importantÃssimas para a educação. Alunos só prestam atenção a informações que lhes são relevantes em algum nÃvel. O fato de ser comum ouvir alunos reclamando sobre o que aprendem e ouvir professores reclamando sobre a falta de atenção e interesse dos alunos aponta para algo alarmante: estão ensinando conteúdos sem relação com o cotidiano dos estudantes.
Se você é professor, ou apenas alguém que gosta de chamar a atenção para si, lembrem-se da máxima: atenção é interesse. Enquanto você estiver mostrando informações relevantes terá toda a atenção da platéia.
Conclusão: o Contexto
Todas as ideias apresentadas acima se relacionam ao tema maior “contexto”. Quando dizemos que as pessoas se comportam de acordo com seu contexto, estamos nos referindo ao tipo de eventos descritos como controle de estÃmulos, percepção e atenção. Há, ainda, mais conceitos que poderiam ser discutidos dentro deste tema, como abstração, inteligência e cultura. No entanto, isso extrapolaria o objetivo central de explicar de forma resumida como a análise do comportamento compreende o contexto (controle de estÃmulos).
Fiquem à vontade para fazer comentários e tirar dúvidas…
Robson Brino Faggiani
One Response
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Eu tenho uma pergunta: Estimulos que controlam nossos comportamentos sao sempre introduzidos de forma artificial em nossas vidas? explique para mim, se possivel com exemplos praticos do nosso cotidiano.