“Em suma, precisamos modificar em grande parte o comportamento humano; (…) o que precisamos é de uma Tecnologia do Comportamento†(Skinner, 1971).
Assim como hoje muitos entendem o comportamento como algo inacessÃvel à ciência, barrando assim a evolução dos estudos a respeito, há alguns séculos o que hoje se chama de fÃsica, quÃmica, biologia, também eram barradas pelos mesmos problemas. Como comentado no texto anterior, o fÃsico Galileu Galilei, por exemplo, foi fortemente criticado e punido ao defender o Heliocentrismo, idéia esta que ameaçava o dogma de que a terra era o centro do universo.
Na quÃmica, atribuÃam a natureza  (quente, frio, sólido, lÃquido, etc.) dos objetos a substâncias metafÃsicas existentes dentro deles; substâncias estas que jamais foram estudadas por ninguém, nem ao menos vistas, mas diziam existir com base na suposta complexidade dos processos. Se houvesse então alguma modificação na natureza ou composição dos objetos, ela era atribuÃda a uma mudança na quantidade ou qualidade da tal substância escondida e inobservável. Toda e qualquer conclusão a respeito desta substância e dos motivos das mudanças ocorridas no objeto observável não passava de opinião pessoal, impossÃvel de ser verificada. A quÃmica nasceu de fato apenas a partir do momento em que deixaram de falar sobre a existência do que ninguém nunca viu, mas todo mundo dava detalhes, e adotou para sà um método de estudo calcado na observação e descrição de relações entre eventos, começando por Lavoisier ao formular a lei de conservação da massa, rompendo com a teoria flogÃstica.
A teoria flogÃstica dizia que  quando os objetos eram queimados eles perdiam flogisto, substância a que atribuiam o fato das coisas se queimarem. Lavoisier descobriu que, ao invés de perder flogisto, substância imaginária que diziam existir dentro dos objetos que se queimavam, os objetos absorviam oxigênio, substância contida no ar e responsável pelo fato do fogo manter-se aceso. Lavoisier descobriu também o gás carbônico e, posteriormente, ainda atribuiu ao oxigênio a cor vermelha do sangue arterial e ao gás carbônico a cor escura do sangue venoso.
Na biologia, os estudiosos tiveram de romper com a idéia de que o corpo humano era intocável e movido por uma entidade mágica, chamada vis viva ou alma. Isso começou a acontecer após o século XVI, onde os fisiólogos começaram a dissecar animais e estudar o seu funcionamento; inclusive foi neste século que a Medicina também evoluiu, já que durante a idade média, sofria forte resistência por parte da igreja católica que condenava qualquer tipo de pesquisa cientÃfica pelos motivos já citados. Foi apenas no século XVII que Willian Harvey, contrariando toda a tradição filosófico-teológica a respeito do funcionamento do corpo, aventurou-se a abrir o corpo humano, descobrindo então o sistema circulatório e, por consequência, observando que os componentes de nosso organismo mais pareciam com uma máquina onde as partes se correlacionam, trabalhando em conjunto, do que com algo sagrado movido por uma força mágica.
As mesmas crÃticas sofreu – e ainda sofre – Darwin por propor a teoria da evolução das espécies, contradizendo assim a idéia de que o ser humano é o supra-sumo da criação ao demonstrar que somos apenas mais uma espécie como qualquer outra; propondo então que nossas caracterÃsticas são fruto da evolução, não de uma força suprema criadora. Sua descoberta gerou muito incômodo e lhe rendeu muitas crÃticas, tanto é que ele hesitou por muitos anos em publicar o resultado de seus estudos, só o fazendo no momento em que, caso não publicasse seus resultados, perderia o crédito da descoberta para outra pessoa que estava chegando as mesmas conclusões.
Os estudos de Darwin também contribuÃram muito para os estudos com humanos. A partir deles, chegou-se à conclusão de que é possÃvel, por exemplo, fazer testagens de remédios (ou estudar o comportamento) em animais infra-humanos antes de estudar nos humanos, bem como utilizar material animal em alguns procedimentos médicos, justamente por terem descoberto que partilhamos de algumas caracterÃsticas com os animais.
Todas estas ciências só evoluÃram a partir do momento em que adotaram para sà um método de estudo calcado na objetividade, abandonando inferências arbitrárias e desenvolvendo métodos de testagem e descrição de relações entre eventos fÃsicos. Somente a partir do momento em que foi exigida uma certa criteriosidade que envolve a adoção de passos claros, bem descritos, estruturados e sistematizados, estas ciências foram capazes de estarem em condições de evoluÃrem e contribuÃrem de maneira sólida e crescente com o nosso conhecimento. O mais preocupante, porém nem tanto, é que para muitos na psicologia, chega a ser ofensa falar a respeito do uso deste tipo de procedimento controlado e sistematizado.
É preocupante porque isso impede o desenvolvimento de técnicas de trabalho bem controladas; técnicas possÃveis de manipulação, alteração e capazes de funcionar com qualquer pessoa -, onde realmente se sabe o que está sendo feito, porque está sendo feito, e porque se chega a um determinado resultado.
O que, como dito antes, diminui um pouco a preocupação, é que mesmo Darwin, bem mais antigo do que a psicologia cientÃfica, ainda é fortemente criticado e até rejeitado por alguns que não admitem a idéia de não seremos seres especiais, mas apenas uma espécie a mais entre os animais. Além disso, muitos se dizem Darwinistas, porém, ao citarmos o fato de que somos apenas animais que, em função do histórico de interação com o ambiente de nossa espécie desenvolvemos estas caracterÃsticas que hoje temos, se sentem ofendidos. Muitos ignoram a teoria Darwinista a tal ponto que tem a capacidade de afirmar que Darwin disse que somos descendentes dos macacos, o que é uma mentira; Darwin nunca disse isso.
Ao inferir a existência de estruturas metafÃsicas existentes dentro de nós que dão a nosso comportamento suas caracterÃsticas, determinando-o assim, caÃmos no mesmo erro que os filósofos antigos caÃam ao atribuir a vis viva, ou os religiosos, a alma, o fato de nosso corpo ter vida. CaÃmos também no mesmo erro que caiam os filósofos e religiosos ao dizer que a terra era o centro do universo, já que todos os fenômenos importantes observados “acontecem nela”. CaÃmos também, para concluir o raciocÃnio, no mesmo erro que caÃam os filósofos ao atribuir a uma substância existente dentro dos objetos a sua natureza. Todas estas conclusões, assim como a vigente de que o comportamento é determinado por uma estrutura metafÃsica existente dentro de nós, advém da inferência: método onde o observador, a partir de sua própria experiência pessoal, subjetiva, atribui explicação a um fenômeno emitindo uma opinião pessoal sobre o que imagina que acontece. Uso o termo “imagina” porque é isto mesmo o que acontece. É o máximo que se pode fazer a respeito de algo que não pode ser observado e muito menos estudado: imaginar.
Ao dizer que um dado comportamento acontece porque há uma estrutura dentro de nossa cabeça que o controla, chegamos a outro problema: além de termos que explicar o comportamento observado, temos que explicar o funcionamento desta estrutura e como é que se dá a relação dela com o organismo para que este se comporte. Se esta estrutura não é fÃsica, não é observável, não é acessÃvel, como estudá-la? O máximo que se pode fazer, é emitir uma opinião. E mais: como algo não fÃsico pode interferir em algo fÃsico?
Qual vantagem investigativa nos dá uma inferência, sabendo que esta trata-se apenas da opinião de quem a faz, estando sujeita a refletir mais da história de vida e aprendizagem proporcionada pela comunidade verbal do sujeito do que sobre o fenômeno o qual ele infere? Que valor pode ter uma opinião pessoal, sem menor possibilidade de verificação ou generalização, quando se fala em compreender alto tão complexo e diverso como o comportamento humano? Diante de uma outra inferência que, por ser feita por outra pessoa, com história de vida diferente, vivências diferentes, que certamente será também diferente, como saber se ela é um avanço ou apenas um ponto de vista diferente com relação aos estudos sobre a inobservável, indescritÃvel e misteriosa mente? Isso é perigoso pois, como não se tem acesso ao objeto de estudo, não sendo possÃvel então conhecer suas caracterÃsticas, também não é possÃvel estabelecer qualquer tipo de critério que sirva de base tanto para evolução daquele conhecimento, quanto pra julgar se ele é ou não mais acertado do que o outro anterior, o que se pode ter é apenas mais uma opinião, tão duvidosa e subjetiva quanto a outra. Como é possÃvel avançar tecnologicamente em um campo onde tudo o que se tem são opiniões pessoais que, queira ou não, são construÃdas culturalmente? Como é possÃvel falar sobre algo que não se conhece, não se observa, não se estuda? Depende única e exclusivamente da fé acreditar que a mente tem as caracterÃsticas descritas pelo autor X ou pelo autor Y. Como já dito, mas volto a enfatizar, quando um autor fala a respeito desta entidade mágica, por se tratar apenas de uma opinião dele, ele nos conta mais a seu próprio respeito do que sobre a entidade a que se refere. As caracterÃsticas que ele atribui a elas, por não poder observá-la, são caracterÃsticas que ele imagina que ela possua, não que realmente possua.
Uma disciplina que se proponha a estudar algo tão complexo como o comportamento, então, não deve  depender de opiniões pessoais, já que estas, são apenas, com o perdão da redundância: opiniões pessoais. Para falar a respeito das leis que governam o nosso jeito de agir, não podemos nos esquecer, de modo algum, de que cada pessoa possui um modo particular de se comportar, aprendido a partir do momento em que nasce através da interação de sua carga genética com o ambiente onde está inserido; modo este que não pode ser reduzido a especulações ou simples inferências que tem mais a ver com quem as faz do que com o que está sendo estudado, criando então, discordâncias insoluveis entre os teóricos onde cada um fala o que acha que acontece.
Esequias Caetano de Almeida Neto.