O princÃpio das vacinas é muito interessante. Injeta-se no paciente agentes patogênicos ou toxinas, previamente enfraquecidos, causadores da doença que se quer prevenir; esses agentes enfraquecidos são, então, facilmente combatidos pelo sistema imunológico do indivÃduo, que passa a produzir anticorpos que o protegem da doença real. Em outras palavras, ficar doente em nÃvel reduzido prepara o organismo para enfrentar a doença em nÃvel perigoso. Esse princÃpio é aplicável à psicologia? É possÃvel prevenir problemas psicológicos graves se o enfrentarmos em nÃveis menores?
A resposta parecer ser “sim” para ambas as perguntas. Há algumas evidências empÃricas, outras teóricas, de que é possÃvel “vacinar” o comportamento humano:
- Independentemente da abordagem, psicólogos concordam em um fato: crianças mimadas, que não precisam se esforçar para obterem o que desejam, tornam-se adultos sem limites e despreparados para lidar com as frustrações. Estabelecer normas adequadas conduz as pessoas a se tornarem respeitosas e funciona como uma “vacina” contra baixa auto-confiança.
- As afirmações acima são suportadas por um dado interessante: paÃses ricos costumam ter altas taxas de suicÃdio em sua população jovem. Com freqüência, esses dados são interpretados como resultados de uma vida sem dificuldades, em que a persistência e a resistência à frustração não são treinadas nos jovens.
- Na literatura da Psicologia Social sobre persuasão, comenta-se que uma das formas de tornar alguém resistente à manipulação é treiná-la a responder a crÃticas mais leves do que ela ouviria em uma situação de persuasão real.
- Seligman, estudando desamparo aprendido (um fenômeno psicológico irmão da depressão) em cachorros, descobriu que animais cujas histórias de vida envolviam escapar com sucesso de situações aversivas tornavam-se mais resistentes à depressão. Esses resultados foram replicados com humanos.
- A polÃcia e o exército colocam seus cadetes em situação de estresse. A idéia é prepará-los para enfrentar situações tensas com as quais deverão lidar futuramente.
O que há em comum entre os exemplos acima é a aprendizagem. Lidar dificuldades menores hoje ensina a lidar com dificuldades maiores futuras. Se os exemplos acima estiverem corretos e puderem ser generalizados para outros comportamentos-problema, talvez seja necessário rever o modo como criamos nossos filhos e cuidamos de nós mesmos… Vale a pena explorar a metáfora da “vacina psicológica”.
Basicamente, o que essa metáfora nos diz é que devemos preparar as crianças, desde cedo, para enfrentarem possÃveis problemas comportamentais. Isso pode ser feito permitindo que nossos filhos lidem com dificuldades psicológicas em nÃvel reduzido. É preciso tomar cuidado com essa sugestão, no entanto. Não é trabalho dos pais estabelecer propositadamente dificuldades aos filhos, e sim ensiná-los a lidar com eventuais problemas cotidianos.
Um meio termo é necessário. Crianças mimadas, pouco estimuladas e pouco desafiadas provavelmente se tornarão adultos despreparados para a vida moderna e mais suscetÃveis a problemas psicológicos. Por sua vez, nÃveis altos de estresse e abandono na infância produzem adultos sem auto-estima e com propensão a desenvolver psicopatologias. O melhor caminho é ser carinhoso e protetor, mas possibilitar que os filhos lidem com nÃveis cada vez maiores de frustração.
Não é possÃvel afirmar que o princÃpio biológico da vacina é idêntico ao processo de preparação psicológica descrito acima. Ainda assim, a metáfora da “vacina psicológica” parece apropriada para descrever tal processo.
Robson Brino Faggiani
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